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Paz e Segurança (parte 1 de 3): Paz com Deus
Talvez a melhor maneira de começar uma discussão da relação entre Islã, paz e segurança seja lidar com uma afirmação que é ouvida com frequência esses dias: “Islã significa paz.” Se quem faz essa afirmação quer dizer que o significado real da palavra “Islã” é “paz”, então está definitivamente equivocado. É verdade que a palavra Islã e a palavra árabe para paz (salaam) vêm da mesma raiz. Isso demonstra que vai haver uma relação entre as duas. É vitalmente importante entender o que é essa relação e como ela ocorre.
A palavra “Islã” é o substantivo verbal do verbo aslama. Esse verbo é definido como “ele se resignou ou submeteu”. Quando usado em relação a Deus, significa “ele se tornou submisso a Deus.” [1] Dessa forma, o Islã refere-se a um indivíduo que reconhece quem é seu Senhor e reconhece que sua atitude em relação ao seu Senhor e Criador deve ser de submissão e adoração.
Essa compreensão do que a palavra Islã significa é vital para o entendimento da relação entre Islã e paz. Islã, a submissão a Deus, é o que leva à paz verdadeira. A paz verdadeira – interna e externamente - só pode ser o resultado da implementação correta do Islã. Claro, o que se quer dizer não é simplesmente paz como em “ausência de um estado de guerra.” Paz significa muito mais que isso. Pode-se estar livre de guerra e ainda assim sofrer de ansiedade ou desespero e falta de paz. Aqui estamos referindo a um senso completo de paz. O Islã traz tranquilidade e paz de espírito completas que são resultado de perceber que se crê e age de acordo com a orientação do Criador. Essa paz interior pode então se propagar para a família, a comunidade, a sociedade e o mundo como um todo.[2] É uma forma especial de tranquilidade que só pode ser produzida pela crença adequada em Deus. Assim, Deus diz:
“Já vos chegou de Deus uma Luz e um Livro lúcido através do qual Deus conduzirá aos caminhos da salvação aqueles que procurarem a Sua complacência e, por Sua vontade, tirá-los-á das trevas e os levará para a luz, encaminhando-os para a senda reta” (Alcorão 5:15-16)
De fato, Deus está chamando os humanos para a morada de paz eterna:
“Deus convoca à morada da paz e encaminha à senda reta quem Lhe apraz” (Alcorão 10:25)
Para aqueles que seguem esse caminho, sua recompensa suprema será a morada de paz:
“Obterão a morada de paz junto ao seu Senhor, porque ele será o seu protetor por tudo quanto fizerem” (Alcorão 6:127)
Em resumo, não é correto dizer “Islã quer dizer paz”, mas certamente a paz verdadeira vem somente através do Islã.
Como o Islã Traz Paz
Paz verdadeira e completa só pode ser obtida quando os próprios indivíduos alcançam paz interior. Isso resulta somente do Islã ou da verdadeira submissão a Deus. É o único modo de vida consistente com a natureza dos seres humanos. De fato, é o que pode ser chamado de “vida verdadeira.” Assim, Deus diz:
“Ó vós que credes! Atendei a Deus e ao Mensageiro, quando ele vos convocar à salvação.” (Alcorão 8:24)
Conhecer Deus é o que traz verdadeiro contentamento à alma. Se o indivíduo não conhece seu Criador, sua alma estará sempre ansiando por algo que falta em sua vida. Estará sempre agitado e confuso. Se e quando busca outras coisas além de Deus – mesmo coisas que ele acredita que sejam seu “deus” – terminará em desespero quando perceber que todas as coisas que busca não são o Ser que seu coração anseia.
Ibn Taimiyyah escreveu:
Você deve saber que a necessidade humana[3] por Deus – adorá-Lo e não associá-Lo com qualquer parceiro – é uma necessidade com a qual não se pode fazer analogia. Em algumas questões parece a necessidade do corpo por alimento e bebida. Entretanto, existem muitas diferenças entre as duas.
A realidade de um ser humano está em seu coração e alma. Não podem ser prósperos exceto através de sua relação com Deus, sem existir outro deus. Não existe [por exemplo] tranquilidade nesse mundo, a não ser em Sua recordação. Verdadeiramente o homem caminha na direção de seu Senhor e O encontrará. Deve definitivamente encontrá-Lo. Não existe bondade verdadeira para ele exceto encontrá-Lo.[4] Se o humano experimenta qualquer prazer ou felicidade fora de Deus, aquela alegria e felicidade não durarão. Mudará de uma natureza para outra ou de uma pessoa para outra. A pessoa a desfrutará uma vez ou somente parte do tempo. De fato, às vezes a coisa que desfruta e da qual obtém prazer não lhe traz prazer ou satisfação. Às vezes até o prejudica quando chega até ele. E é ainda mais prejudicado por isso. Mas seu Deus está sempre definitivamente com ele sob quaisquer circunstâncias e todos os momentos. Onde quer que esteja, Deus está com ele [através de Seu conhecimento e ajuda]...
Se alguém adora qualquer outra coisa além de Deus - mesmo que a ame e obtenha algum amor nesse mundo e alguma forma de prazer a partir disso – [a falsa adoração] destruirá a pessoa de uma forma maior que o dano causado a uma pessoa que consome veneno...
Saiba que se alguém ama algo por outro motivo que não seja Deus, então aquela coisa amada definitivamente será uma causa de prejuízo e punição... Se alguém ama algo por outro motivo que não seja Deus, aquela coisa o prejudicará esteja com ele ou não....[5]
Toda a fortuna e os bens desse mundo não serão capazes de trazer ao humano contentamento interior verdadeiro. Abu Hurairah narrou que o Profeta, que a misericórdia e bênçãos de Deus estejam sobre ele, afirmou:
“A verdadeira riqueza não é através de muitas propriedades e bens. A verdadeira riqueza está na autossatisfação.”[6]
Outro hadith afirma:
“A verdadeira riqueza é a riqueza do coração. Pobreza verdadeira é a pobreza do coração.” [7]
Uma vez que um indivíduo esteja em paz consigo mesmo e livre de agitações interiores, ele pode entrar em relações verdadeiramente pacíficas com outros. Não terá razão para sentir ressentimento em relação ao resto do mundo – aqueles a quem ele pode culpar por sua falta de paz interior. De fato, uma vez que o objetivo dele é a Vida Futura, não tem motivos até para sentir inveja ou ódio em relação aos outros por conta do que receberam nesse mundo – enquanto que a inveja e o ódio atingem a raiz das relações pacíficas com outros.
Footnotes:
[1] E. W. Lane, Arabic-English Lexicon (Léxico Árabe-Inglês) (Cambridge, Inglaterra: The Islamic Texts Society, 1984), vol.1, p. 1413.
[2] Sobre esse ponto pode-se ler Sayyed Qutb, Islam and Universal Peace (Islã e Paz Universal, em tradução livre) (Indianapolis, IN: American Trust Publications, 1977), passim.
[3] A palavra que ibn Taimiya usou foi abd (servo ou escravo); entretanto, sua inferência é todo ser humano.
[4] Isso é porque a alma, por sua natureza enraizada, anseia por seu encontro com seu Criador.
[5] Ibn Taimiya, Majmoo, vol. 1, pp. 24-29.
[6] Registrado por al-Bukhari e Muslim.
[7] Registrado por ibn Hibbaan. De acordo com al-Albaani, é autêntico. Ver al-Albaani, Saheeh al-Jaami al-Sagheer, #7816.